“Você nunca foi fã daquele meu namorado baixinho. Nem do que tinha mania de perseguição ou o que era vegetariano. Odiou aquele que tirou minha virgindade e nunca entendeu porque é que eu havia ficado tanto tempo com aquele metido a valentão, no ensino médio. Eu me corroía de ciúmes calada, vendo suas mil e uma namoradas entrarem e saírem da sua casa a cada fim de semana. Uma mais indiscreta, sem noção ou peituda, do que a outra. Mas eu não era uma delas, e por isso gostava de você. Eu não precisava bater na porta para entrar na sua casa, não precisava chamar sua mãe de “senhora” e não era substituída por nenhuma loira da bunda maior que a própria cabeça. Você sabia até do meu ciclo menstrual, o quanto eu odiava o inverno e filmes de terror. Nunca deu risada das minhas manias estranhas e assistia Diário de Uma Paixão ao meu lado, a cada término de namoro. A gente era o que ninguém jamais seria. “Melhores amigos? Amantes? Um casal?” Eu te perguntava todas as noites em que você dormia escondido lá em casa, e você respondia seguido de um bocejo: “Somos o que quisermos ser”, e dormia. Mas eu continuava com meus namorados, meus planos para o futuro e sonhava com um marido, três filhos e morar no interior. Você queria ser rico, comprar um carro para cada dia da semana e ir morar em um país em que bigamia fosse permitido. Éramos o que queríamos ser, principalmente opostos. Eu gostava de chá gelado, vodca e coca-cola. Você amava café, whisky e pepsi. Íamos todas as terças-feiras na mesma sorveteria para ficar reparando ou falando da vida dos outros, e ouvir aquela velhinha que quase sempre estava dormindo atrás do balcão dizer, “isso pode dar em casamento!”. Podia mesmo. Mas nunca deu. Te conheci na praça pertinho da escola, você andando de bicicleta e eu procurando meus óculos. Seu pneu encontrou-os por mim. E desde os 6 anos, nós eramos quase que inseparáveis. Mas nunca deu em nada. Nem em casamento, nem em namoro. Foi só alguns beijos atrás da igreja e algumas noites escondidos no seu quarto. Jamais poderia ter dado em algo. Mesmo meus pais te considerando quase um genro e sua mãe amando cozinhar pra mim, nós nunca fizemos parte um dos planos do outro. Mesmo que eu tivesse uma quedinha por você e você tendo ciúmes de tudo que tentasse se aproximar de mim, mesmo eu amando o jeito que você se arrumava e você dizendo que eu tinha “o melhor beijo de língua da cidade”, mesmo seu café tendo cheiro de vida mansa e eu andando de mãos dadas com você sem problema algum, até mesmo namorando. Mesmo no fundo, um amando o outro sem admitir ou saber, nós nunca ficamos juntos. Porque poderíamos ser o que quisermos. Menos um do outro.”
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